Estratégia: modelos de concepção ambiental

Os diferentes modelos de concepção ambiental, apresentados neste texto, refletem a diversidade dos modos de percepção e análise ambiental existentes na literatura organizacional. Enquanto para alguns autores, por exemplo, é possível atingir o pleno conhecimento do ambiente com base em procedimentos formais e objetivos, para outros é fundamental levar em consideração as limitações da capacidade humana para captar e processar dados complexos.


Ao mesmo tempo, enquanto em alguns modelos ficam evidenciadas as fronteiras entre o ambiente externo e a organização, em outros prevalece a permeabilidade das fronteiras organizacionais enquanto pressuposto condicionante dos processos de decisão estratégica.
  R. T. Lenz e J. L Engledow, em “Análise ambiental: a aplicabilidade da teoria corrente”, apresentam cinco modelos de concepções distintas para o ambiente, a partir de três dimensões: descrição das propriedades estruturais do ambiente, pressupostos sobre a natureza e fontes da mudança ambiental e meios para se adquirir conhecimento sobre o ambiente. Os modelos são classificados em: modelo da estrutura da indústria, modelo cognitivo, modelo do campo organizacional, modelo ecológico e da dependência de recursos e modelo da era.
  No modelo da estrutura da indústria, segundo Michael E. Porter, em “Estratégia competitiva”, os aspectos dominantes do ambiente existem dentro e em torno da indústria em que a organização compete. Consodera-se que não existe “o” ambiente, como algo único, uma entidade holística, pois as organizações podem enfrentar múltiplos ambientes de forma simultânea, cada um com suas próprias características.
  O ambiente, neste modelo, consiste em um conjunto de forças competitivas que estabelecem ameaças e oportunidades. De acordo com essa abordagem, as “forças externas”, ou seja, os elementos ambientais que fogam ao escopo da chamada “indústria”, são apenas vagamente mencionados. O modelo, portanto, não oferece uma explicação aprofundada para a forma como essas forças se configuram e se conectam aos agentes e às forças competitivas dentro da indústria. Pressupõe-se que a mudança ambiental é evolucionária, irregular e tem origem na ação dos competidores em conjunto com a influência de forças externas, que estão além dos limites da indústria. As forças externas, segundo Porter, são agrupadas em: ameaça de novos entrantes, poder de barganha dos fornecedores, poder de barganha dos clientes, ameaça de produtos substitutos e intensidade da rivalidade entre as organizações.
  As organizações que adotam esta visão ambiental acreditam que o conhecimento do ambiente pode ser obtido por meio da implantação de um sistema formal e objetivo de análise dos competidores.
  O modelo cognitivo, a compreensão coletiva dos tomadores de decisão a respeito do ambiente e de outros elementos que afetam suas atividades é representada sob a forma de uma estrutura cognitiva, que possui vários sinônimos: mapas de causa, mapas conceituais, mitos dominantes, teorias da ação ou mapas cognitivos.
  As estruturas cognitivas consistem em um conjunto interconectado de compreensões carregadas de interesses, preocupações e características da atividade individual. Em sua essência, essas compreensões ignoram distinções convencionais entre o ambiente e a organização, prevalecendo uma visão de que as estruturas cognitivas dominantes é que influenciam a estratégia. As estratégias, por sua vez, são consideradas como modos de interação com a realidade, por meio de experiência, que se torna uma condição de entrada necessária para a aprendizagem organizacional e para as decisões estratégicas.
  A mudança no ambiente é evidenciada pela inconsistência entre o que os gestores pensam que deveria acontecer e o que realmente acontece. As estruturas cognitivas são reformuladas a partir dos novos significados impostos pela experiência organizacional, sendo o conhecimento do ambiente obtido pelos processos de representação e aprendizagem organizacional.
  Nesta concepção, o artigo de L. Smircich e C. Stubbart “Gerenciamento estratégico em um mundo formal”, anteriormente referenciado, sugere que a abordagem do ambiente objetivo, que vê o ambiente como algo concreto, real e fácil de ser gerenciado, é praticamente impossível de ser dimensionada e compreendida pela sua complexidade. Sugerem uma perspectiva mais realista e aplicada para os estrategistas por meio da perspectiva interpretativa do ambiente, considerando principalmente que o ambiente é algo socialmente construído através das interações sociais dos participantes da organização. Neste caso, a organização e o ambiente são construídos conjuntamente. As implicações para os gerentes, segundo os autores sugerem são: a) Os ambientes são construídos através das deliberações delineadas socialmente e acordadas nas relações existentes na organização. Os gestores fazem parte do processo e o influenciam com suas experiências passadas. Assim, olhar para frente é amplamente influenciado pelos fatos e experiências do passado. b) Oportunidades e ameaças são construídas por interpretações coletivas dos gestores, nos limites de suas relações. c) O papel dos estrategistas deve ser repensado para se concentrar nos valores, símbolos, linguagem e dramas que constroem os sentidos existentes na organização.
  Os autores alertam para a necessidade de se estudar a mente dos estrategistas e observar como elaboram a percepção da realidade. Chamam também a atenção para as limitações existentes para a interpretação da realidade, em que se deve reconhecer a necessidade de espaço para a construção social da realidade através das interações sociais. Sugerem também a observação das limitações de recursos criativos e emocionais e da competitividade entre os participantes e outros fatores que restringem a construção de qualquer realidade.
  O modelo do campo organizacional, de acordo com Paul J. Dimaggio e W. Powell, em “A jaula de ferro revisitada: isomorfismo institucional e racionalidade coletiva no campo organizacional”, um campo organizacional é um conjunto de organizações que, no agregado, constituem uma área reconhecida da vida institucional: fornecedores-chave, consumidores de recursos e produtos, agências reguladoras e outras organizações que produzem serviços e produtos similares. O campo organizacional também pode ser delimitado em termos de estruturas culturais-cognitivas, normativas, compartilhadas, ou por um sistema regulativo comum, de modo a constituir uma reconhecida área da vida institucional, segundo W. R. Scott em “Instituições e organizações”.
  Neste modelo, as concepções sobre a estrutura ambiental são classificadas em não hierárquica e hierárquica. A concepção não hierárquica pode ser encontrada em: trabalhos sobre sistemas de troca, como prescrevem S. Levine e P. White em “Intercâmbio como uma estrutura para o estudo das relações interorganizacionais” e O. Williamson em “Mercados e hierarquias”; conjunto organizacional como define W. Evan em “O campo organizacional: diante de uma teoria de relações interorganizacional”; campo interorganzacional, como define R. Warren em “O campo organizacional como um foco para investigação”; e o modelo dos stakeholders como define R. Freeman em “Gerenciamento estratégico”. Nesta visão, considera-se o ambiente um conjunto de organizações interdependentes. A ênfase é colocada nos objetivos e na distribuição de poder entre as organizações interdependentes e a organização focal, avaliando-se a eficiência e a efetividade das trocas. Uma exceção é o modelo de análise dos stakeholders, apresentado por R. Freeman na obra há pouco cidadã, cujo argumento central gira em torno da busca por uma estratégia negociada de cooperação máxima entre os objetivos dos stakeholders e os objetivos organizacionais.
  Na concepção hierárquica, pode-se citar o modelo apresentado por J. Thompson em “Organizações em ação”, que divide o ambiente em dois níveis: 1) o ambiente geral ou macro ambiente, aparentemente em fronteiras externas, e 2) o ambiente de tarefas ou microambiente, incluindo as organizações que se relacionam diretamente entre si. Os pesquisadores que adotam este modelo afirmam que a mudança ambiental origina-se no ambiente geral e flui unidirecionalmente para o ambiente de tarefas. Porém, há pouca alusão aos fatores que iniciam o processo de mudança no ambiente geral. Destaca-se, ainda, a necessidade de congruência entre a estrutura organizacional e as previsões ambientais.
  O modelo ecológico e da dependência de recursos apresenta a abordagem da ecologia populacional como uma proposta alternativa para a visão de adaptação dominante. Não há argumentos suficientes para concluir que a grande variabilidade estrutural das organizações ocorra somente por um processo de adaptação, como prescrevem Michael Hannan e John Freeman em “Ecologia populacional das organizações”.
  São muitas as restrições na capacidade de adaptação das organizações, as quais acabam gerando uma inércia estrutural. Como argumentam Hannan e Freeman, há pouco citados, quanto mais fortes as pressões, mais baixa a flexibilidade de adaptação das organizações e mais provável que a lógica da seleção ambiental seja apropriada. Como consequência, o problema da inércia estrutural é importante na escolha entre os modelos de adaptação e seleção.
  Duas abordagens são apresentadas neste modelo: a de sistema aberto e a de hierarquia. Na abordagem de sistema aberto, as organizações são consideradas os elementos mais importantes do ambiente. Sob este ponto de vista, F. Emery e E. Trist, em “A textura causal do ambiente organizacional”, descrevem quatro tipos de ambiente: plácido-randonizado, plácido-agrupado, reativo perturbado e campos turbulentos. S. Terreberry, em “A evolução dos ambientes organizacionais”, por sua vez, incorpora a teoria da seleção natural de Darwin na descrição ambiental, enquanto H. E. Aldrich em “Organização e ambiente”, incorpora as conceitos da seleção natural a limitação de recursos para formular um modelo de ecologia populacional, o qual descreve o ambiente em termos da natureza e distribuição de recursos.
  Na segunda abordagem, a da hierarquia, Glover (1968) sugere que os ambientes são formados por quatro subsistemas interrelacionados: a comunidade; a cultura; o habitat; e o produto. Juntos, esses elementos incluem ao mesmo tempo aspectos físicos e sociais do ambiente. Seguindo esta mesma visão, H. Torelli, em “Teoria organizacional: um panorama ambiental”, oferece um modelo ecológico de cinco níveis: o extra-ambiente, o macroambiente, o ambiente de tarefas, auto-setting e a organização.
  Ainda seguindo a abordagem da hierarquia, J. Pfeffer e G. Salanik, em “O controle externo das organizações”, consideram o ambiente total como um contexto de recursos, dividindo-o em três níveis: 1) é a totalidade de indivíduos e organizações relacionados de algum modo entre si e com uma organização focal; 2) mais restrito, consiste de organizações com as quais a organização focal interage diretamente; e 3) ambiente representado/construído que varia em relação a seus níveis de munificência (disponibilidade/escassez de recursos críticos), concentração (distribuição de poder e autoridade) e interconexão (quantidade e padrões de ligações entre organizações).
  Nesta abordagem, a mudança ambiental é descrita como um processo relativamente gradual, envolvendo ajustamento entre um conjunto diverso de elementos interdependentes. Considera-se que os ambientes não mudam aleatoriamente, ou descontinuamente, porque existem duas forças que se amortecem mutuamente: a inovação e a aceitação. Pressupões-se, ainda, que o ambiente pode ser conhecido a partir das subunidades organizacionais, as quais têm seus próprios ambientes locais.
  No modelo da era, o ambiente é considerado como um padrão distinto de estruturas sociais, relações institucionais, papeis e valores, fortalecidos e sustentados por certas características estruturais. D. Yankelovich, em “Novas regras” e G. Lodge, em “A nova ideologia americana”, argumentam que o conjunto de ideias ou significados é o sustentáculo de uma estrutura social. Já A. Toffler, em “A terceira onda”, sugere que são certos processos sociais, não as ideias, que sustentam as estruturas ambientais. O autor apresenta, ainda, algumas esferas de ação ambiental, tais como tecnosfera e sociosfera.
  Tecnologia e experimentos realizados por indivíduos na busca de auto-realização, dentro de um contexto de instituições predominantes (família e organizações), são considerados as fontes primárias de mudança ambiental. A mudança, por sua vez, ocorre em três estágios: ordem vigente, transição turbulenta e nova ordem vigente. Nesta visão, o conhecimento do ambiente é possível via previsões futuristas e serviços de consultoria.

Cláudio Márcio Araújo da Gama

Florianópolis / SC
http://marcio.gama.zip.net

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